Políticas públicas

Políticas públicas na era dos governos delirantes

Políticas públicas podem fracassar em função de uma série de cálculos mal feitos ou de infortúnios que não poderiam ter sido antecipados. O sucesso nunca é garantido, e frustrações, ainda que parciais, são inevitáveis. Mas uma coisa é certa, é extremamente improvável, para não declarar impossível, a formulação de políticas públicas eficazes a partir de um diagnóstico falho da realidade

A habilidade de lideranças populistas em identificar e canalizar insatisfações é notória, mas a aptidão praticamente acaba aí. Não é atoa que esses personagens tendem a ser bem-sucedidos enquanto candidatos, apenas para se mostrarem um grande fracasso enquanto governantes. Quando no governo, a fórmula mágica, conforme já discutido em texto anterior a este (aqui), tende a ser a proposição de soluções simples para problemas complexos. 

No entanto, quando trata-se do populismo contemporâneo que tomou conta do Brasil, o poço é ainda mais profundo. O governo brasileiro mostra-se não somente incapaz de oferecer soluções efetivas para problemas complexos, mas, na realidade, não consegue nem mesmo identificar o que seria o problema.

Vejam bem, é impossível que o governo brasileiro conceba políticas ambientais eficientes para as queimadas que assolam o Pantanal ou a Amazônia porque, para os transeuntes do Planalto, esse problema nem sequer existe, ou, quando reconhecido, é obra de índios, caboclos e ONGs. É também impensável a condução de uma política externa eficaz ou um discurso minimamente satisfatório nas Nações Unidas, uma vez que o Ministro das Relações Exteriores compreende a globalização e o Sistema ONU como componentes de um majestoso complô comunista chinês – basta conferir em seu blog (Metapolítica 17).

O enfrentamento à pandemia, por sua vez, dispensa grandes comentários. O problema supostamente nunca foi o coronavírus, mas sim uma mídia alarmista que disseminou o pânico entre a população e instaurou o caos social no país. Não fui eu quem disse isso, foi o presidente… na ONU. A partir desse diagnóstico, o combate ao vírus só poderia ter se tornado secundário, importante mesmo era combater o jornal das nove… e o das doze… e os impressos. Nesse contexto, a cruzada contra a imprensa tornou-se até mesmo pretexto para invocar a Lei de Segurança Nacional e investigar jornalistas.

Não surpreende, portanto, que as políticas públicas ou mesmo a política externa do atual governo brasileiro pareçam tão despropositadas. Elas partem de um diagnóstico descabido da realidade. É o mesmo que oferecer água para alguém que tem fome. Quer dizer, não é mesmo.  A não ser que a água esteja contaminada. Aí sim é o mesmo.

Quando a premissa é falsa, tudo que se segue é mais do mesmo. Os argumentos e possíveis soluções serão certamente coerentes com o diagnóstico falso, apenas não se sustentaram frente a realidade. Mas de que importa? Afinal, quando as políticas públicas fracassarem certamente não faltará em quem colocar a culpa.

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