Eleições no Peru: a escolha entre o menor dos males

Eleições no Peru: a escolha entre o menor dos males

Os peruanos foram às urnas no dia 6 de junho para decidir o que, possivelmente, será a eleição presidencial mais importante da história do país. Após um 2020 estremecido por uma crise sanitária sem precedentes – o Peru possui o maior índice per capita de mortes pelo coronavírus do mundo – o país realiza novas eleições. Mas como se uma crise de saúde pública não fosse suficiente, o país se encontra em meio a uma crise política sem precedentes. Em novembro de 2020, o país teve três presidentes em uma semana, após uma deposição e uma renúncia. 

Assim, o Peru vive um cenário que, sob olhares mal treinados poderia ser entendido como fantasioso ou extraordinário, mas que, aos olhos mais acostumados de latino-americanos, talvez não seja assim tão inacreditável. Diante disso, as eleições presidenciais peruanas foram caracterizadas por uma fragmentação extrema. No total, eram dezoito candidatos no primeiro-turno e ao menos seis possuíam reais chances de vitória. Ao final, os dois candidatos que ocupam cada um dos extremos do espectro político avançaram para o segundo turno: Keiko Fujimori, candidata de extrema-direita do partido Força Popular, e Pedro Castillo, candidato do partido de extrema-esquerda Peru Livre. 

Independente do escolhido, a democracia peruana continuará sob estado de extrema tensão. Não somente porque ambos exibem preocupantes tendências autoritárias, mas porque o vencedor contará com um debilitado apoio popular. Pedro Castillo venceu o primeiro turno eleitoral com apenas 19% dos votos válidos e Keiko Fujimori emplacou o segundo lugar com apenas 13,5%. Juntos, os candidatos obtiveram 31,1% dos votos válidos. Enquanto os grandes vencedores, em números absolutos, do primeiro turno eleitoral peruano foram os votos brancos e nulos, o que, por si só, já indica a fragilidade da democracia peruana, uma vez que o exercício do voto válido é um importante mediador da confiança e da satisfação popular em relação à democracia.

Tendo isso em vista, o segundo turno eleitoral peruano é compreendido pela maioria dos cidadãos do país como uma escolha entre o menor dos males. Pedro Castillo é fortemente criticado pela elite metropolitana peruana em função de sua proposta de nacionalização de setores da economia, além disso, o candidato do partido Peru Livre é acusado de propor medidas autoritárias para a resolução da crise política peruana, como a criação de uma Assembleia Constitucional, que o permitiria desenhar uma Constituição mais favorável a seus objetivos políticos. Vale ainda ressaltar que Castillo possui um discurso extremamente conservador em relação aos costumes, posicionando-se de maneira contrária ao casamento homossexual e de forma favorável a pena de morte, ainda que tenha recuado após retaliações.

Do lado da extrema-direita, o drama não é menor. O sobrenome da candidata do Força Popular elucida o porquê. Keiko é filha do ex-presidente e autocrata Alberto Fujimori. Eleito em 1990, após derrotar o Nobel de Literatura Mario Vargas Llosa em um momento histórico também marcado por crises – econômica e de segurança – Fujimori orquestrou um autogolpe em 1992, ao dissolver o Congresso e fechar o Judiciário do país. Em 2000, o pai de Keiko se viu obrigado a renunciar e pedir asilo político no Japão e em 2009 foi condenado a 25 anos de prisão por crimes contra a humanidade e corrupção. Alberto Fujimori permanece preso, enquanto sua filha, que também já passou três meses na prisão em função de um escândalo de corrupção envolvendo a Odebrecht, é alvo de investigações e candidata à presidência.

Esta eleição presidencial peruana é sobre quem é capaz de suportar o que, uma vez que nenhum dos presidenciáveis detém um apoio popular significativo. A democracia na América Latina, por vezes, é tida como preferível, mas nunca como indispensável, ao menos não pela maioria. No Peru, não poderia ser diferente, e o país que preferiu um candidato autocrata em 1990, quando elegeu Alberto Fujimori, desta vez, se encontra diante de uma escolha muito mais desafiadora. Assim, ainda que muitos no Peru prefiram a democracia, talvez desta vez, não seja essa preferência que definirá o futuro do país.

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