Capitão Girodono: um comício de loucos
Era uma vez… em uma terra muito distante… um governante desvairado, mas cheio de autoestima. Chamava-se Capitão Girodono e sob seu governo, o povo amargava uma realidade melancólica e sombria.
Uma peste, para a qual existiam antídotos e tratamentos, havia devastado o reino devido à estupidez e à bandidagem do Capitão. Enquanto outros reinos se recuperavam da fatalidade, na terra de Girodono, tudo custava caro e tudo encarecia. Havia os que passavam fome e havia aqueles que a ignoravam. Havia aqueles cuja família fora desfalcada e havia os que bradavam contra a empatia. Além disso, os trabalhos minguavam, assim como qualquer esperança na melhora.
No reino de Girodono, reinava a amargura. Contudo, contra todas as leis da lógica e da razão, uma parte da população ainda aplaudia e exaltava Girodono. Vejam bem, o Capitão não possuía quaisquer talentos ou virtudes. Não era culto nem belo. Faltava-lhe inteligência e educação. Era grosseiro e ignorante. Um bruto, mas sem a força. Um frouxo sem sensibilidade. Girodono não era um cidadão médio, estava abaixo da média e, de alguma forma, uma parcela minoritária do povo sentia-se representada não pela mediocridade, mas pela inferioridade do Capitão.
Foi assim que Girodono, ao se ver acuado no ofício do poder, decidiu levar às ruas aqueles que o aclamavam. Financiou comboios e carroças para levar às principais cidades do reino seus adoradores ferrenhos. Era um domingo, dia do Senhor, mas, apesar de Girodono e toda a sua família falarem muito no Senhor, eles se referiam, na realidade, ao próprio Girodono que, para eles, era o único Senhor possível. Assim, enganavam uma parcela significativa do povo que acreditava que eles se referiam a algum tipo de Deus.
Girodono passou então a manhã e a tarde do dia santo esbravejando ao público que o assistia e, apesar do pouco que se entendia daquilo que o Capitão gritava, devido às suas dificuldades de dicção e vocabulário, seus seguidores o aplaudiam. Afinal, não importava o que era dito, mas sim quem estava a dizer. Coincidência intrigante com o comportamento da criança mimada que Girodono havia sido e que ainda era, mesmo tendo assumido um formato corporal maduro. O menino mimado, quando faz birra, ninguém entende, mas os pais acham uma graça, não pelo o que ele diz, por quem está a dizer.
Assim, parecia que, conforme o dia avançava, o reino de Girodono se transformava em uma espécie de conto de fadas às avessas e, aquilo que parecia inacreditável se desenrolava diante de olhos entristecidos, deixando a impressão de que o inconcebível passava a existir justamente porque ninguém havia concebido que um dia ele existiria. Contudo, nos dias de hoje, ao analisar minuciosamente as fontes históricas, é possível visualizar cada alerta e sinal do que viria a seguir. Isso é porque, em condições normais, compreende-se para trás e vive-se para frente, mas, nas terras de Girodono, vivia-se para trás e entendia-se… bom, ninguém entendia nada.
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